MÚSICA NA CORRIDA: SERÁ QUE A SUA PLAYLIST ESTÁ TURBINANDO O SEU DESEMPENHO E SUA BIOMECÂNICA? OU NÃO?
Alterações em sua biomecânica podem ocorrer com a utiização da música durante a corrida. O preço disso? Aumento ou a queda de performance, dependendo da forma como vc se adapta à música escutada.
A influência da música no desempenho esportivo é um tema que tem despertado crescente interesse na comunidade científica. Corredores, em particular, frequentemente recorrem à música como uma ferramenta para melhorar o foco, a motivação e a percepção de esforço durante o exercício. No entanto, a compreensão dos efeitos reais da música na biomecânica da corrida ainda é um campo em desenvolvimento. O estudo de Martinez e colaboradores (2025) investigou a fundo essa questão, analisando como ouvir música durante a corrida altera a cinética (forças) e a cinemática (movimentos) da corrida em diferentes contextos, considerando o gênero, a velocidade e o tipo de superfície.
Os autores do estudo partem do pressuposto de que a música pode atuar como um estímulo externo capaz de modular o ritmo e a intensidade da corrida. A sincronização das passadas com a batida da música, por exemplo, pode influenciar sua cadência (o número de passos por minuto) e seu o comprimento, alterando a forma como o corredor se move. Além disso, os autores ainda acreditam que a música possa afetar a percepção de esforço, permitindo que o corredor mantenha um ritmo mais elevado por mais tempo.
O estudo utilizou uma abordagem experimental rigorosa, comparando a corrida com e sem música em diferentes condições. Corredores amadores de ambos os sexos, realizaram testes em diferentes velocidades ( 8 e 10 km/h) e em diferentes superfícies (esteira e pista). A análise dos dados cinéticos e cinemáticos revelou padrões interessantes e complexos.
Um dos principais achados do estudo é que a música altera significativamente a cinética e a cinemática da corrida, mas esses efeitos variam de acordo com o gênero, a velocidade e a superfície. Em geral, a música tende a aumentar a cadência e diminuir o tempo de contato com o solo, o que sugere uma corrida mais eficiente e com menor impacto. No entanto, esses efeitos foram mais pronunciados em mulheres do que em homens, e em velocidades moderadas do que em velocidades altas.
Os autores explicam que essas diferenças podem estar relacionadas a fatores biomecânicos e hormonais. As mulheres, em média, possuem menor massa muscular e maior flexibilidade do que os homens, o que pode torná-las mais suscetíveis à influência da música na cadência e no tempo de contato com o solo. Essa combinação pode torná-las mais responsivas. A maior flexibilidade, por exemplo, pode permitir uma adaptação mais rápida ao ritmo da música, enquanto a menor massa muscular pode levar a uma maior dependência do estímulo externo para manter um ritmo constante.
Além disso, a música pode afetar a liberação de hormônios como a dopamina, que desempenha um papel importante na motivação e no controle motor. A música tem o potencial de afetar a liberação de hormônios como a dopamina, um neurotransmissor crucial para a motivação e o controle motor. Estudos citados pelos autores sugerem que as mulheres podem apresentar uma maior sensibilidade aos efeitos da dopamina no sistema motor, o que poderia explicar a resposta mais pronunciada à música durante a corrida. Além disso, fatores psicológicos e comportamentais também podem desempenhar um papel importante. As mulheres, em geral, tendem a ser mais receptivas a estímulos externos e a apresentar uma maior capacidade de sincronização com a música. Essa maior receptividade pode traduzir-se em uma adaptação mais rápida e eficiente ao ritmo da música durante a corrida.
Outro achado interessante do estudo é que a superfície de corrida também modula os efeitos da música. Na esteira, a música tende a aumentar a cadência e diminuir o tempo de contato com o solo, enquanto na pista esses efeitos são menos pronunciados. Os autores sugerem que a esteira, por ser uma superfície mais uniforme e previsível, facilita a sincronização com a batida da música, o que pode explicar as diferenças observadas.
Os resultados do estudo têm implicações importantes: para os corredores, o estudo demonstra que a música pode ser uma ferramenta útil para melhorar o desempenho e a eficiência da corrida, mas é importante estar ciente de que os efeitos variam de acordo com o gênero, a velocidade e a superfície. A escolha da música e a forma como ela é utilizada devem ser individualizadas, levando em consideração as características e os objetivos de cada corredor. Para os profissionais da área da saúde e do esporte, o estudo oferece insights valiosos sobre como a música pode influenciar a biomecânica da corrida. Essa informação pode ser utilizada para otimizar o treinamento de corredores, prevenir lesões e personalizar programas de reabilitação. Por exemplo, a música pode ser utilizada para aumentar a cadência em corredores com risco de lesões por sobrecarga, ou para melhorar a eficiência da corrida em corredores que buscam melhorar seu desempenho.
É importante ressaltar que essas são apenas hipóteses, e que a compreensão completa dos mecanismos que explicam a maior suscetibilidade das mulheres à música na corrida ainda requer mais investigação. No entanto, os resultados do estudo destacam a importância de considerar as diferenças de gênero ao analisar os efeitos da música no desempenho esportivo.
Em suma, o estudo demonstra que a música é um modulador poderoso da corrida, capaz de alterar a cinética e a cinemática em diferentes contextos. A compreensão desses efeitos pode auxiliar corredores e profissionais da área a utilizar a música de forma estratégica para otimizar o desempenho, prevenir lesões e promover uma experiência de corrida mais prazerosa e eficiente. Pesquisas futuras deverão se aprofundar na investigação dos mecanismos neurais e hormonais que medeiam os efeitos da música na corrida, bem como na identificação de estratégias para maximizar seus benefícios e minimizar seus riscos. Assim como, a necessidade de pesquisas longitudinais para identificar uma possível efetividade desta estratégia para a prevenção de lesões e aumento de performance quando utilizada na forma de objeto de intervenção durante um período de treinamento.
Referência Bibliográfica:
Martinez G, Ventura L, Rossanigo R, Morrone M, Meloni M, Boi A, Melis A, De Luca LM, Bussu F, Uccula A, Behm DG, Cereatti A, Deriu F, Manca A. (2025) Music Listening Alters Kinetics and Kinematics of Running: A Cross-Over Study Comparing Gender, Running Speeds, and Surfaces. J Strength Cond Res. Apr 16.