EDUCATIVOS DE CORRIDA: ATRAPALHAM OU AJUDAM NO DESEMPENHO?
Os educativos de corrida, exercícios específicos que visam aprimorar a técnica e a eficiência do movimento, são amplamente utilizados por corredores e treinadores em todo o mundo. Acredita-se que esses exercícios, que incluem variações de elevações de joelho, chutes e passadas laterais, podem melhorar a coordenação, a força e a mecânica da corrida, levando a um melhor desempenho. No entanto, a eficácia real dos educativos de corrida tem sido objeto de debate na comunidade científica, com estudos apresentando resultados conflitantes.
Um estudo de Whelan, Kenny e Harrison (2016) publicado no International Journal of Sports Science & Coaching, investigou o conhecimento e o uso de educativos de corrida por treinadores de atletismo. Os resultados revelaram que a maioria dos treinadores acredita que estes exercícios são uma parte vital do treinamento para melhorar o desempenho, enfatizando a importância de que esses exercícios sejam específicos para a técnica de corrida. No entanto, o estudo também apontou uma lacuna entre o conhecimento baseado em pesquisa sobre a técnica de corrida e o que os treinadores realmente implementam em seus treinos. Muitos treinadores parecem basear suas escolhas de educativos no que outros treinadores bem-sucedidos estão fazendo, em vez de uma compreensão científica das ativações musculares e padrões de movimento envolvidos na corrida.
Essa falta de base científica para a seleção de educativos levanta preocupações sobre a eficácia de alguns exercícios comumente usados. O estudo destacou o Anferseen (chute no glúteo) como um exemplo de educativo potencialmente questionável, já que a ativação muscular durante esse exercício pode não corresponder à ativação muscular durante a corrida. Essa desconexão entre o educativo e o movimento real da corrida pode levar a padrões de movimento ineficientes e, possivelmente, aumentar o risco de lesões.
Em contraste, um estudo escrito por renomados cientistas brasileiros, encabeçados por Ana Azevedo, publicado no Journal of Strength and Conditioning Research (2015), examinou os efeitos da inclusão de educativos de corrida em um programa de treinamento intervalado. Os resultados desse estudo sugeriram que a adição de alguns educativos a um programa de treinamento intervalado de 15 semanas não foi eficaz para melhorar os parâmetros biomecânicos relacionados ao desempenho. Na verdade, o estudo observou que os educativos de corrida podem até aumentar a carga mecânica sobre o corpo, potencialmente comprometendo o controle de sobrecarga e aumentando o risco de lesões.
Esses resultados conflitantes destacam a complexidade da questão dos educativos de corrida. Embora alguns treinadores acreditem firmemente em sua eficácia, a evidência científica disponível não oferece um suporte claro para seu uso generalizado. É possível que a eficácia destes exercícios dependa de vários fatores, incluindo a seleção dos exercícios, a técnica de execução, a população de corredores e o programa de treinamento geral.
Uma possível explicação para os resultados conflitantes é a falta de especificidade de alguns educativos de corrida. Se um educativo não imita de perto os padrões de movimento e as ativações musculares da corrida, é improvável que ele melhore o desempenho ou reduza o risco de lesões. Além disso, alguns educativos podem até reforçar padrões de movimento ineficientes, levando a um desempenho abaixo do ideal e a um risco aumentado de lesões.
Outro fator a ser considerado é a carga mecânica imposta pelos educativos de corrida. Embora alguns deles possam parecer de baixo impacto, eles ainda podem colocar estresse significativo sobre as articulações e os tecidos. Se um corredor já estiver experimentando fadiga ou sobrecarga, a adição de educativos de corrida pode exacerbar esses problemas e aumentar o risco de lesões.
Diante dessas considerações, é importante abordar exercícios com cautela e discernimento. Antes de incorpora-los em seu programa de treinamento, é crucial considerar seus objetivos, seu nível de experiência e sua condição física atual. Também é importante selecionar educativos que sejam específicos para a técnica de corrida e que não imponham carga mecânica excessiva sobre o corpo.
Em última análise, a decisão de usar ou não educativos de corrida deve ser baseada em uma avaliação individualizada das necessidades e objetivos de cada corredor. Se você optar por incorporar educativos em seu programa de treinamento, é importante fazê-lo com moderação e sob a orientação de um treinador qualificado. Ao aborda-los com cautela e discernimento, você pode maximizar seus benefícios potenciais e minimizar o risco de lesões.
Referências bibliográficas:
AZEVEDO, Ana PS et al. Usage of running drills in an interval training program: Implications related to biomechanical parameters of running. The Journal of Strength & Conditioning Research, v. 29, n. 7, p. 1796-1802, 2015.
WHELAN, Niamh; KENNY, Ian C.; HARRISON, Andrew J. An insight into track and field coaches’ knowledge and use of sprinting drills to improve performance. International Journal of Sports Science & Coaching, v. 11, n. 2, p. 182-190, 2016.