CALÇADOS QUE INDUZEM À PISADA COM ANTEPÉ PROPORCIONAM MAIOR VANTAGEM PARA A PERFORMANCE?
No mundo da corrida coloca-se um peso muito grande, exacerbado até, sobre o papel do tênis de corrida, principalmente para o público de atletas recreacionais. Isso é “meio caminho corrido” para os designers de calçados de corrida levantarem hipóteses interessantes no projeto de calçados futuristas que prometem uma performance aumentada com a sua utilização. Mas digo que pouquíssimos destes são testados e tem seus resultados apresentados para críticas e testes independentes na comunidade científica.
Seguindo na contramão do que acontece normalmente, o estudo de Yokoyama e seus colaboradores (2005), publicado na revista Footwear Science, investigou se o uso de calçados que induzem involuntariamente uma pisada com a parte da frente do pé (forefoot strike- antepé) pode alterar o consumo de oxigênio (VO2) durante a corrida, tanto em corredores habituais de retropé (RFS - calcanhar) quanto em corredores que já utilizam a pisada com a parte da frente do pé ou o meio do pé (não-RFS).
A questão central do estudo é se a mudança na forma como o pé entra em contato com o solo pode influenciar na economia de corrida . Para responder a essa pergunta, os pesquisadores recrutaram 23 corredores do sexo masculino, divididos em dois grupos: corredores habituais de RFS (aqueles que normalmente tocam o solo primeiro com o calcanhar) e corredores não-RFS (aqueles que tocam o solo primeiro com a parte da frente do pé ou com o meio do pé).
Os participantes realizaram seis sessões de corrida em esteira, cada uma com duração de 5 minutos, em velocidades lentas e rápidas abaixo do limiar de lactato. Eles usaram três tipos de calçados: um tênis de corrida tradicional (controle), um tênis projetado para induzir involuntariamente a pisada com a parte da frente do pé (Wave Duel Pro [WDP]) e um terceiro tênis usado para outro propósito (não analisado no estudo).
Com relação à mudança na pisada, o mais notável foi que todos os participantes, incluindo os corredores habituais de RFS, passaram a utilizar a pisada com a parte da frente do pé ao usar o tênis WDP. Isso demonstra que o calçado foi eficaz em alterar o padrão de pisada de forma involuntária.
Quanto à Economia de Corrida em Corredores Não-RFS, os que já utilizavam a pisada com a parte da frente do pé, não apresentaram diferença significativa no consumo de oxigênio (VO2) entre o tênis WDP e o tênis de controle. Isso sugere que, para esses corredores, mudar para um tênis que força a pisada com a parte da frente do pé não traz benefícios adicionais em termos de economia de corrida.
Já para os RFS houve uma pequena melhora na Economia de Corrida com uma pequena redução no consumo de oxigênio (VO2) ao usar o tênis WDP, em comparação com o tênis de controle. Essa redução foi de aproximadamente 0,9%, sendo neste estudo, estatisticamente significativo. E com relação a variáveis fisiológicas não houve diferenças significativas na concentração de lactato no sangue ou na frequência cardíaca quando correndo com os dois tipos de tênis, tanto nos corredores RFS quanto nos não-RFS.
Embora o estudo tenha encontrado uma pequena melhora na economia de corrida em corredores habituais de RFS ao usar o tênis WDP, é importante considerar a magnitude dessa melhora. Uma redução de 0,9% no consumo de oxigênio pode parecer pequena, mas pode se traduzir em uma melhora significativa no desempenho em provas de longa distância, como a maratona.
No entanto, é importante notar que o estudo foi realizado em esteira, em condições controladas. É possível que os resultados sejam diferentes em condições de corrida ao ar livre, em terrenos variados. Além disso, o estudo incluiu apenas corredores do sexo masculino, o que limita a generalização dos resultados para corredoras. Outro fator importante a ser considerado, e que já se vem descrevendo na literatura científica há tempos com a discussão da corrida em antepé, é sobre a questão da transição da forma de correr de retropé para antepé, onde hoje já existe um consenso de que esta transição deve ser feita de forma progressiva.
Para os técnicos de corrida, fisioterapeutas e médicos do esporte, este estudo oferece insights valiosos sobre a influência do calçado na biomecânica da corrida. Ao considerar a prescrição de calçados para corredores, é importante levar em conta o padrão de pisada habitual do atleta, bem como seus objetivos de desempenho e histórico de lesões.
Em resumo, o estudo de Yokoyama e seus colaboradores (2025) sugere que o uso de calçados que induzem involuntariamente a pisada com a parte da frente do pé pode trazer uma pequena melhora na economia de corrida para corredores habituais de retropé. No entanto, mais pesquisas são necessárias para confirmar esses resultados e para determinar se essa melhora se traduz em um melhor desempenho em provas de longa distância.
Referências Bibliográficas:
YOKOYAMA, Shotaro et al. Running economy with shoes that elicit an involuntary forefoot strike in the habitual rear and non-rear foot strike runners. Footwear Science, v. 17, n. 1, p. 37-45, 2025.
MATIAS, Alessandra B. et al. Rearfoot, midfoot, and forefoot motion in naturally forefoot and rearfoot strike runners during treadmill running. Applied Sciences, v. 10, n. 21, p. 7811, 2020.